Mar Sem Sal
“Quando descobrimos aquilo de que somos feitos e a maneira como somos construídos, descobrimos um processo incessante de construção e destruição e apercebemo-nos de que a vida está à mercê desse processo interminável. Tal como os castelos de areia das praias da nossa infância, a vida pode ser levada pela maré.” António Damásio, O Sentimento de Si (1999)
quinta-feira, 10 de julho de 2014
Dói-me tudo
Dois irmãos.
Terão tido medo? Ou já não tinham medo?
Ou disse o mais velho ao mais novo:
-Estou aqui. Não tenhas medo.
É impossível acreditar-se na Humanidade em certas noites.
Não sei se vou conseguir dormir.
Outra vez.
segunda-feira, 7 de julho de 2014
Os papéis na parede
Disse-lhes adeus,
lancei-lhes um último olhar,
fiz um meio-sorriso
sem ironia.
As coisas não disseram nada,
ali ficaram, imóveis, coladas à parede
como se estivessem à espera do fim,
num dia qualquer.
Estas coisas já são passado,
já não são úteis,
já não servem.
Mas ali estão.
Ali permanecem fiéis a um passado recente,
fiéis à organização dos dias.
Não se espantam,
nem temem.
Aguardam pelo fim.
Que fim terão estas coisas?
Serão arrancadas de súbito, amachucadas,
quando já não esperavam?
Serão substituídas por outras?
Serão acariciadas, guardadas em gavetas,
visitadas de ano a ano?
Ou ficarão ali para sempre,
até ao fim dos dias,
até
todos os dias serem já parte do
Passado.
terça-feira, 29 de outubro de 2013
"Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mão à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
e eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os meus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.
Adeus."
(Eugénio de Andrade)
quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
"Quem terá dito isto?"
"No seu primeiro discurso no Parlamento Italiano, em Junho de 1921, afirmou: “O Estado tem de ter uma política policial, judiciária, militar e estrangeira. Todas as restantes políticas, e não excluo sequer o ensino secundário, devem voltar para a actividade privada dos indivíduos. Se queremos salvar o Estado, temos de abolir o Estado colectivista.”
tradução minha de Mussolini, “Il Primo Discorso alla Camera”, 21 June 1921. Mussolini (1934a, p. 187)"
sábado, 5 de janeiro de 2013
Ano novo
Desde miúda tenho uma superstição que me acompanha: o número 13 dá-me sorte. Será? Será este ano um ano de sorte? Quando olho para a minha família, para os meus filhos a dormirem serenamente, sinto-me com sorte. E sorrio.
2013 não me vai apanhar distraída. Vou tratar de ser feliz, contra todas as expectativas.
terça-feira, 10 de abril de 2012
Voz...
Cala-te ...
Cala-te, voz que duvida
e me adormece
a dizer-me que a vida
nunca vale o sonho que se esquece.
Cala-te, voz que assevera
e insinua
que a primavera
a pintar-se de lua
nos telhados,
só é bela
quando se inventa
de olhos fechados
nas noites de chuva e de tormenta.
Cala-te, sedução
desta voz que me diz
que as flores são imaginação
sem raiz.
Cala-te, voz maldita
que me grita
que o sol, a luz e o vento
são apenas o meu pensamento
enlouquecido….
(E sem a minha sombra
o chão tem lá sentido!)
Mas canta tu, voz desesperada
que me excede.
E ilumina o Nada
Com a minha sede.
(José Gomes Ferreira)
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012
sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012
Vida
a que chamam realidade
não me obedece como os outros
que trago na cabeça?
Eis a grande raiva!
Misturem-na com rosas
e chamem-lhe vida.
(José Gomes Ferreira)
quinta-feira, 19 de janeiro de 2012
Prémio Nobel da Traição 2012: João Proença*
Que foi ontem. 4 anos passaram já, e este Mar cá continua a blogar. Uma vezes mais, outras vezes menos, de acordo com as marés (de disposição, de trabalho, etc...).
Parabéns a este Mar sem Sal que aqui continuará. Mas na realidade, ontem nem me apeteceu escrever nada. Estava demasiado deprimida a pensar nos últimos acontecimentos do dia.
E que acontecimentos!!!
Precisamente ontem esse senhor da foto, que dá pelo nome de traid... quer dizer, João Proença, foi o protagonista do momento.
Com a sua prestação legitimou um terrível ataque aos trabalhadores que supostamente iria defender, na tal "concertação social".
Era já claro para muitos trabalhadores que ele não iria defender coisa nenhuma, mas na verdade, engane-se quem assim pensou: João Proença foi para esta reunião defender os interesses do capital. Missão que desempenhou na perfeição. Quando um sindicalista recebe aplausos do patronato é mau sinal...
Para ti, João proença, vai o meu mais profundo desprezo, traidor!
(*)Como, muito bem, foi referido no facebook pelo amigo Manuel Coelho, o prémio Nobel da Traição vai para este indivíduo, que provou que pode ser bem mais perigoso que os donos do dinheiro. Pior que o capital, são os lacaios do capital. Afinal, estes últimos, tudo fazem para agradar, não se importando de, pelo meio, aniquilar os seus pares, os outros trabalhadores.
Para terminar, um bem haja aos visitantes (resistentes) deste blogue.
Cá continuaremos na LUTA.
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
E ainda hoje é dia 2
Podia aqui dizer imensas coisas bonitas acerca das expectativas para este ano.
Também podia dizer imensas coisas feias acerca das velhas políticas que vão sufocando as nossas já sufocadas gargantas... Xiça. É tanta coisa para pagar! E tudo mais caro. E mais mal feito.
Uma conta da luz acima de 200 e tal euros, umas taxas moderadoras e análises laboratoriais do hospital acima de 60 e tal euros (não é de agora, não vos assusteis, amigos, mandaram-me agora a conta...), podia bem discorrer acerca da sacanice das portagens, e de como tem sido impossível instalar uma via verde porque os dispositivos mal chegam esgotam logo, quer nos ctt, quer no ACP. No ACP, então, distribuem as senhas de atendimento às 9h da manhã, e às 9h e 1 minuto já não há senhas para tratar das vias verdes....
E ainda só vamos a dia 2.
Isto promete.
MAS.... como eu dizia inicialmente: podia falar-vos de tudo isso...
MAS também vos posso falar de, neste mesmo dia 2, ter participado numa distribuição de um documento do PCP sobre o aumento das taxas moderadoras, à porta do hospital (daquele mesmo que me está a cobrar coisas...). Documento que teve grande receptividade, diga-se de passagem!
Neste mesmo dia 2 encontrei pessoas que lutam por um mundo melhor. E lutam todos os dias.
Neste mesmo dia 2 soube que uma amiga está grávida (e feliz!).
E ainda só vamos a dia 2...
Isto promete... dizia eu!