terça-feira, 22 de abril de 2008

Vende-se país. Barato. É pegar ou Largar.

Eu sei que isto está mau. Eu sei que este país está entregue a pessoas sem escrúpulos, que usam o dinheiro dos meus impostos para beneficiar interesses próprios, para favorecer os amigos, tendo em vista que estes os favoreçam quando estiverem de saída dos cargos que ocupam no poder. Eu sei isso tudo.
Mas, por qualquer razão, talvez até por uma questão de formação, lá vou tentando agir de acordo com as regras estipuladas, pela via correcta, sempre com um sentido de honestidade. Penso que é a melhor das posturas: não querer fazer as coisas por "baixo do pano", não iludir, não "passar a perna".
Fui educada no espírito de Abril. Apesar de ser filha de um marinheiro e de uma costureira que não tinham mais do que a 4ª classe (ou I ciclo, como é designado agora) os meus pais fizeram-me acreditar na liberdade, na honestidade, na luta por um ideal, na perseverança, e sobretudo, na integridade. E eu acreditei - que ingénua - que quem trabalha é recompensado, que quem é honesto alcança os objectivos, que quem age conforme as regras age correctamente, que tentar é melhor que não tentar, que ser coerente dá os seus frutos, que aprender é a melhor das armas neste mundo.
E depois cresci. E cheguei à conclusão que quem vai ao Big Brother é que é reconhecido, que quem não tem talento mas tem cunha é que fica por cima, quem rouba passa na televisão mas quem investiga num laboratório não. Etc, etc. Podia aqui ficar eternamente a dar exemplos. Dou-vos apenas mais um: hoje sairam os resultados dos subsídios atribuídos pela Direcção Geral das Artes a projectos artísticos nas mais diversas áreas. Mais uma vez constato que quem obtém financiamento por parte do Ministério da Cultura é quem tem boas relações no meio artístico. Digo-o com a maior frontalidade. Poderão perguntar se cheguei a ter esperanças que houvesse honestidade neste concurso público, e a resposta é "Sim". Afinal, a esperança faz parte da nossa vida. Todavia, viver em Portugal faz qualquer um perder a esperança. Nem que seja momentânea. E, neste exemplo concreto que refiro, as consequências são graves a vários níveis. Nesta, como noutras áreas, as pessoas que lucram são sempre as mesmas. Por outro lado, para as que ficam de fora, apesar das suas qualidades, esforços, trabalho árduo e coerência, o único sentimento que fica é a desilusão... e a vontade de emigrar.



Nota de rodapé: É claro que se baixarmos os braços serão ainda menos os que lutam. E por uma questão de integridade não o faço. A luta continua. Com raiva. Mas continua.

9 comentários:

Anónimo disse...

Há dias em que parece que não vale a pena. Os abutres reproduzem-se e instalam-se de tal maneira por aí, aproveitando e vivendo da podridão semeada por políticas reaccionárias e imbecis (nesta caso para a área da cultura), que a vontade é mesmo só a de ir para outras paragens lidar com gente séria.
Mas depois vamos, a pouco e pouco, recordando os resistentes, os amigos e camaradas, as pessoas de imensa qualidade que por cá vão ficando sem desarmar, e só podemos digerir mais este vómito e resistir.
Vemos um país que até podia ser bonito, e pensamos: aqui fazemos falta. Não é pelos abutres que ficamos. É pelos que acreditam, como nós, que podemos fazer disto um país. Já estivemos nesse caminho, há pouco mais de trinta anos. O facto de lá termos estado mostra-nos que é possível.

Anónimo disse...

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Maria disse...

Fizeste uma reflexão muito lúcida sobre este país. E outros, onde se passa exactamente o mesmo.
Tantas vezes já´escrevi que tenho vontade de emigrar...
... mas há uma força que sai cá de dentro e, quanto maiores são as dificuldades, mais vontade tenho de gritar (leia-se, de vir para a rua e lutar).
É o que vamos continuar a fazer, Sal.

Beijos

samuel disse...

Sal

Obrigado por ficares... mas conheço esse sentimento.
Toma lá um beijito, mas desta vez, do Zé Carlos Ary.

Não me digam mais nada senão morro
aqui neste lugar dentro de mim
a terra de onde venho é onde moro
o lugar de que sou é estar aqui.

Não me digam mais nada senão falo
e eu não posso dizer eu estou de pé.
De pé como um poeta ou um cavalo
de pé como quem deve estar quem é.

Aqui ninguém me diz quando me vendo
a não ser os que eu amo os que eu entendo
os que podem ser tanto como eu.

Aqui ninguém me põe a pata em cima
porque é de baixo que me vem acima
a força do lugar que for o meu.'

(José Carlos Ary dos Santos)

Anónimo disse...

Não é a primeira vez que tal vos acontece. A culturQuem manda na cultura é no mínimo imbecil, para não dizer outra coisa. mas não é verdade que os medíocres, incluindo holandeses, estão bem instalados neste País?!... Emigrar para onde?!... A corrupção está instalada em quase toda a Europa. ficar paralutar.

Anónimo disse...

e eu pudesse, "basava" mesmo!
beijocas grandessss
vovó Maria

Justine disse...

Sal,o teu post é um lamento lúcido, uma declaração de princípios e um grito de força e de esperança.
Que nunca abandonaremos, apesar dos ventos...
Mas às vezes dá um cansaço!

Fernando Samuel disse...

Tão bonita a tua nota-de-rodapé!
Lendo-a ficamos com mais força e vontade de lutar.

Anónimo disse...

Por que nao:)